Expurgos do FGTS: Mendes quer apreciação constitucional
Defesa não invocará o alegado prejuízo aos cofres da União.
O advogado-geral da União, Gilmar Mendes, espera que prevaleça hoje a perspectiva constitucional durante o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) de recursos extraordinários, que reivindicam o pagamento da diferença de correção monetária aplicada sobre as contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Em sua defesa, que será
oral, Mendes deverá concentrar-se nos aspectos jurídicos sem invocar o alegado prejuízo aos cofres da União estimado em cerca de R$ 70 bilhões.
De acordo com Mendes, a tese central é que não há contrato, mas sim um instituto e que as alterações implantadas pelos planos econômicos (Bresser, Verão, Collor I e II) fizeram-se de modo legítimo, incorporadas no conjunto da legislação.
Quanto aos índices de correção alegados, disse que as mudanças ocorreram antes de haver a consolidação do direito adquirido alegado pelos autores das ações em curso no STF e em outros tribunais no País.
– Estamos pela primeira vez tendo a chance de discutir a questão do ponto de vista constitucional e isso tem nos animado a respeito de uma vitória desta tese. A jurisprudência do Supremo em outros casos, como na matéria dos vencimentos de funcionários públicos, reforça nossa posição – comentou.
Caso a União sai vitoriosa, Mendes informou que será examinada, caso a caso, a possibilidade de caber ação rescisória no sentido de reverter as atualizações já feitas, por força de decisão judicial, nas contas do FGTS pela Caixa Econômica Federal.
Ainda sobre a hipótese de vitória hoje no STF, Gilmar Mendes disse que se ocorrer confronto com decisões futuras tomadas por outros tribunais, regionais e estaduais, a tendência é o Supremo uniformizá-Ias de acordo com seu entendimento em relação ao assunto.
Foi lembrado por Mendes que o debate nos tribunais tinha sido colocado sob a ótica do Direito ordinário, tendo isso causado dificuldades à Caixa quando discutia o problema na Justiça. "Porém vários tribunais, especialmente no Rio Grande do Sul, caminharam para reconher que estávamos diante de um tema eminentemente constitucional, tal como ocorreu na discussão de planos econômicos também no STF", disse o advogado-geral.
Relação jurídica
A União não falará de números, dando ênfase a tese de que há uma grande diferença entre a "natureza contratual" da relação jurídica existente entre os depositantes em cadernetas de poupança e os bancos, e a relação decorrente dos depósitos em contas vinculadas ao FGTS, que teria "natureza institucional", sem qualquer conotação contratual.
O advogado-geral da União vai bater na tecla de que não há, no caso, direito adquirido por parte dos reclamantes. E que, por estar em causa o princípio do direito adquirido, a questão é constitucional, e não infraconstitucional.
Para a União, as leis monetárias (os diversos planos econômicos, do Plano Bresser, de 1987, ao Collor II, de 1991) ao definirem, extinguirem ou criarem o padrão monetário nacional são imediatamente aplicáveis, não ferindo qualquer direito adquirido.
Além do mais – está no memorial distribuído pela advogado-geral da União aos ministros do Supremo Tribunal Federal – "ressalvados os casos em que a Constituição exige, expressamente, a correção do real valor da moeda, a lei pode estipular um índice de correção monetária inferior".
Assim, para a Advocacia-Geral da União, dado o caráter "exclusivamente institucional" dos depósitos do FGTS, não incide no caso a jurisprudência do STF referente às cadernetas de poupança, mas, sim, a jurisprudência que admite a aplicação imediata das leis que alteram o regime jurídico institucional do direito de propriedade alusivo aos depósitos do FGTS, "sem que importe em lesão a direitos adquiridos".
O descumprimento da lei federal nº 5.958/73, que estabeleceu a forma progressiva de capitalização dos depósitos do FGTS, foi lembrado pelo advogado Accacio Barrozo, da Razão Consultoria Jurídica, como um exemplo de como a União vem burlando a legislação vigente no país. Ele disse que a Caixa desprezou a tabela instituída que variava de 3% a 6% de correção, conforme o número de anos decorridos da opção pelo Fundo, e limitou-se a corrigir indistintamente em 3%.
Fonte: Jornal do Commercio
Data:12 de abril de 2000